(Promessa é dívida e atendendo aos reclamos de meus leitores...)


As razões porque sou 100% a favor de quaisquer modalidade de cotas.

Bem, antes de mais nada ,eu gostaria de dizer que espero estar falando com pessoas que sabem que o racismo existe nesse país e não é coisa da cabeça de negros com mania de perseguição. Ok, go on.

Eu sou a favor das cotas porque acho que durante séculos a universidade foi coisa apenas para a elite ainda que os pobres contribuam (e são os que mais contribuem) para a manutenção da mesma. De forma que acho que uma universidade democrática e pública deve agregar todo mundo. Não é nada justo os pobres pagarem para os filhos de seus patrões estudarem de graça, vamos combinar.


Algumas pessoas alegam que com as cotas vai cair o nível da universidade pública. Eu discordo disso veementemente e as estatísticas recentes discordam disso também. Por uma razão muito simples:

Os conteúdos estudados no ensino médio pouco são aproveitados na universidade (no meu caso que estudei letras: química orgânica, ou inorgânica, física, matemática e biologia serviram para absolutamente nada). O único caso em que os conhecimentos do ensino médio são muito utilizados são nos cursos de engenharias, exatas e biomédicas. E mesmo assim quem faz exatas e engenharias só usa matemática e física (biologia, geografia, história vai pro lixo), quem faz biomédicas, idem.

Pra quem faz direito, só tem importância os contéudos de língua portuguesa.

Repito: os dados estatísticos apontam que o desempenho dos cotistas não é inferior (em alguns casos é superior) em relação aos não cotistas. Assim como os primeiros-lugares dos vestibulares, na maioria das vezes, não são os que têm melhor desempenho no curso.

Mas, se o desempenho não é inferior, não vai cair a qualidade da universidade (esse é o argumento preferido de quem é anti-cotas), porque essa celeuma?

Eu, pessoalmente, tenho uma teoria. Os ricos, os classe média, a elite no Brasil (lembre-se, se você ganha mais que R$ 2 mil por mês você faz parte do decil mais rico da população e se você tem computador em casa sua família é igual a menos que 5% dos lares brasileiros), acostumaram-se a chamar de DIREITO o que em verdade é PRIVILÉGIO. Antes, praticamente 100% das vagas ficavam com os alunos que vieram das escolas particulares (12% do alunado) e agora 80% das vagas vão ficar com eles e 20% com os 88% que estudam em escolas públicas. Mesmo assim deu essa polêmica toda.


(Talvez eu devesse dizer que estudei em escolas particulares a minha vida toda, nunca seria beneficiadas pelas cotas na maneira como entendo que devem existir. Os anti-cotas costumam dizer que os pró-cotas são aqueles que seriam diretamente beneficiados por elas).

Os pobres não estão na universidade. E isso é estatístico. Nos cursos como medicina, psicologia, direito e engenharia eles são 0% e nos cursos menos "elitizados" como licenciaturas eles são, no máximo, 15%. Veja bem: 15% onde a maioria absoluta da população é pobre e onde para fazer parte do decil mais rico você precisa apenas de uma renda de R$ 2 mil.

É por isso que sou a favor de cotas sociais.
Na verdade elas já existem hoje. E são de mais ou menos 100% de vagas para ricos e/ou mais privilegiados. Só estamos invertendo a equação hohoho

Você poderia dizer: mas é justo uma pessoa que tomou uma nota melhor perder sua vaga para uma que tirou uma nota menor? E eu, porque sou professora de escola pública, te peço que considere o seguinte: Se um aluno da escola pública que trabalha o dia todo, estuda à noite, e quando chega em casa depois das 23, dorme em cima dos livros pra no dia seguinte levantar às 4:30 (ele mora na periferia, longe pacas do trabalho), consegue 60 na prova do vestibular mas perde e um playboy que não trabalha, toda quarta vai ao cinema, viaja nas férias, fala inglês, sempre estudou em escola particular, tira 75 e passa, qual dos dois tem mais mérito??

Eu acredito piamente que o primeiro tem mais mérito apesar de não ter passado. O mérito da classe média é perfeitamente discutível. Costumo dizer que não há mérito, há retorno no investimento.

E você também poderia dizer: mas precisa melhorar a escola pública, é lá que está o problema. Concordo. E quem luta a favor de cotas não é contra melhoria do ensino público, muito pelo contrário. Mas, sejamos realistas, se o governo resolvesse empenhar todas as suas forças em melhorar o ensino público a partir desse minuto, em quanto tempo você acha que colher os primeiros resultados positivos? Eu, sendo muito otimista, diria 15 anos. E até lá? Continuamos permitindo que pessoas sejam excluídas? Para mim inclusão social está na pasta de urgência. Não sei se é assim pra você.

Eu acredito que, além das cotas sociais (a que atinge alunos da rede pública de ensino), as cotas raciais também são necessárias. Primeiro, porque dentre os pobres, os negros são os mais pobres. Da parcela mais pobre da população (os que estão abaixo da linha de pobreza e os pobres) negros são mais de 90%. Assim, a utilização de cotas sociais, apenas, continuaria a atingir apenas os brancos pobres e os negros pobres continuariam excluídos. (pesquisas recentes em instituições onde as cotas sociais foram implantadas confirmam isso)

Estudos desenvolvidos pela Federação de Associações de Órgãos de Assistência Social e Educação (FASE) indicam que apesar de o Brasil ocupar o 79º lugar no IDH da ONU, a coisa é bem diferente quando os indicadores de desenvolvimento humano são desagregados por sexo e raça. A população branca que compreende pouco mais que 50% da população alcança a 49º posição enquanto que o IDH relativo à população negra do Brasil ocupa a 108º posição.

Para que você possa entender melhor o que isso significa: África do Sul que há bem pouco tempo vivia sob regime de apartheid ocupa a 103°, Cabo Verde ocupa a 105° posição e a população negra no Brasil a 108°.

Há outros países africanos na companhia da população negra do Brasil: Argélia, Guiné Equatorial, Egito, Gabão, Namíbia e Botswana.

Os negros apresentam, em todos os indicadores sociais constitutivos do IDH, brutais diferenças, das quais a mais dramática é uma esperança de vida, em média, seis anos inferior à dos brancos, variando até doze anos a menos quando desagregamos esse indicador por faixa etária ou região, como é o caso do Norte e Nordeste do país.

Sueli Carneiro afirma que "os diferentes IDHs encontrados para brancos e negros no Brasil refletem, por fim, a coexistência, num mesmo território, de dois países apartados". E eu digo que a situação da população negra brasileira é IGUAL E, EM MUITOS CASOS, PIOR DO QUE NA ÁFRICA.

César Benjamin diz que "carnavalização das nossas relações raciais escamoteia a rigidez da segregação espacial e social que separa negros e brancos. Ignora solenemente a concentração dos negros nas favelas, palafitas, cortiços, nas periferias das grandes cidades. Ou seja, encontra-se naturalizado o paradigma casa-grande e senzala, por isso trata-se com quase absoluta indiferença essas desigualdades raciais. E, no entanto, as poucas, tímidas e insuficientes iniciativas voltadas para o enfrentamento dessas desigualdades, como é o caso das cotas, encontram rapidamente uma oposição aguerrida."

Ele continua dizendo que:

"É nisto que reside a perversidade do racismo brasileiro:

- Na negação patológica da dimensão racial das desigualdades sociais.

- Nos eufemismos que são utilizados para mascará-las: se não há negros nem brancos, como poderá haver políticas específicas para negros? Ou, o problema no Brasil não é racial e sim social ou o que há é um apartheid social!

- Na intransigente recusa de instituição de qualquer mecanismo redutor das desigualdades raciais.

- Na defesa maníaca de propostas que postergam para as calendas o enfrentamento dessa realidade. A educação é sempre usada como panacéia nesses casos."

E eu completo dizendo que os negros nesse país são pobres PORQUE SÃO NEGROS. Esse é um problema racial. E problemas raciais são combatidos com políticas raciais

Você ainda pode ler a opinião de outras pessoas a favor das cotas em:

Um Olhar de Branco sobre as Ações Afimativas

Políticas de Ação Afirmativa em Benefício da População Negra no Brasil - Um Ponto de Vista em Defesa de Cotas

O Melhor das Cotas

UPDATE: Depois de ler o meu próprio post eu percebi que faltou aprofundamento maior em algumas questões. Não pretendo, entretanto, deixar esse post maior do que já está hehehehe

Fica aqui a minha superficial contribuição ao tema. E se alguém quiser debater o assunto, tentaremos fazê-lo.